OPINIÃO
Manuel Rui Azinhais Nabeiro, ou apenas Rui Nabeiro, como era por todos conhecido, foi, sem sombra de dúvida, um ícone campomaiorense no setor empresarial, social, político e internacional e deixa um legado de importância incalculável.
O trampolim para este sucesso e reconhecimento tem o nome de Delta Cafés, a multinacional fundada em Campo Maior que transcendeu a sua terra natal sem nunca a deixar para trás. Para além da sua célebre importância para esta vila “raiana”, Rui Nabeiro e a sua obra tiveram um contributo inegável para Portugal em diversos setores, não ficando apenas pelo café e alargando-se a outros ramos como o da alimentação e bebidas, o do imobiliário, o da indústria e serviços e o do turismo e restauração (criação do Grupo Nabeiro).
Presente em diversas potências económicas mundiais, como Espanha, França, Luxemburgo, Suíça e China, a Delta dá o seu contributo à economia nacional através do aumento do volume de exportações, algo que consequentemente se irá refletir positivamente no Produto Interno Bruto (PIB), e a sua presença física no estrangeiro evita obstáculos associados à exportação, como taxas alfandegárias, distância e logística. Porém, a Delta não marca presença apenas nos “tubarões” económicos, estando também em países que se encontram em desenvolvimento financeiro, como o Brasil e Angola, algo que traz benefícios à empresa, é certo, mas também injeta capitais na economia e gera empregos, melhorando o nível de vida das populações locais. Isto mostra que o setor empresarial e social podem (e devem) “andar de mãos dadas”, algo que se tornou uma imagem de marca do Comendador.
O humanismo de Rui Nabeiro perante aqueles que consigo trabalhavam é facilmente observável e comprovado, e um exemplo disso foi a sua abordagem perante Timor e Angola, dois dos mais importantes produtores de café com quem a Delta trabalha. No ano de 2000, em Timor, pretendia comprar todo o café armazenado do país através de um programa que visava colaborar com o desenvolvimento do setor que empregava à data cerca de 100 mil famílias, e tal programa tinha também como objetivo travar o monopólio norte-americano que controlava grande parte da exportação de café de Timor-Leste. Já em Angola temos o exemplo da ANGONABEIRO, empresa do Grupo Nabeiro que surgiu após um convite do governo angolano para reabilitar a Unidade Fabril de Café LIANGOL, dar incentivos aos produtores locais e produzir o Café Ginga (100% angolano). Este plano veio estimular a produção angolana e ajudar não apenas as grandes e médias fazendas mas também pequenos agricultores. Este aumento na produção e consequente exportação, veio fomentar o crescimento económico angolano, um país da CPLP e um dos principais parceiros de Portugal.
Falar de Rui Nabeiro e da Delta sem falar em Espanha é uma tarefa quase impossível, tendo em conta as estreitas relações que sempre mantiveram. Desde o ínicio no contrabando até ter uma rua em seu nome na cidade vizinha de Badajoz, houve sempre uma associação simbiótica com o país vizinho: Em 2009, o então Rei D. Juan Carlos I deu a indicação para que fosse atribuido ao fundador da Delta a honrosa e prestigiada insígnia da Comenda da Ordem de Isabel a Católica, em 2011 foi nomeado Cônsul Honorário de Espanha no Alentejo com jurisdição nos distritos de Portalegre, Castelo Branco, Évora e Beja, e criando as instalações do Consulado em Campo Maior. A Bandeira e o Escudo Oficial do Consulado Honorário foram-lhe entregues por D. Francisco Villar e Ortiz de Urbina, o Embaixador de Espanha em Portugal na altura, ocasião em que Rui Nabeiro aproveitou mais uma vez para salientar a sua veia iberista: “Um passo importante para a nossa terra e para a nossa região, uma nomeação que aceito com grande honra, e com grande satisfação, que servirá para reforçar o elo de ligação e união entre Portugal e Espanha. Para mim, Espanha sempre foi um parceiro próximo a todos os níveis da minha vida.”
Ainda em 2011 foi-lhe atribuída a Medalha da Extremadura e em 2016 foi então dado o seu nome a uma rua na cidade de Badajoz. Já nos últimos dias, após o seu falecimento, Ignacio Gragera, Presidente da Câmara de Badajoz propôs a nomeação de filho adotivo da cidade ao Comendador, e declarou ao jornal Público que se tratava de “uma pessoa absolutamente fundamental não só para entender a história de Campo Maior, mas também da fronteira”. O autarca de Campo Maior Luís Rosinha, acrescentou ainda que o empresário foi “pioneiro do iberismo e das relações transfronteiriças”. Rui Nabeiro foi também nomeado Embaixador da EuroBEC – Eurocidade Badajoz, Elvas, Campo Maior, um projeto fundamental para aproximar territórios do interior ao mundo desenvolvido, com a criação da plataforma logística e cooperação em áreas fundamentais como a educação, a saúde, eventos, segurança, cultura, rede de transportes e mobilidade laboral transfronteiriça.
Tendo já o seu sucesso solidificado, o empresário campomaiorense tornou-se uma figura pública com uma notoriedade elevada, algo que lhe permitiu ombrear com altas figuras da esfera política nacional, desde Mário Soares a Jorge Sampaio, passando por Marcelo Rebelo de Sousa, Cavaco Silva e António Costa, por exemplo. Os seus méritos empresariais e sociais renderam-lhe diversas distinções de prestígio, como o grau de Comendador da Ordem Civil do Mérito Agrícola, Industrial e Comercial (atribuído pelo então Presidente da República Mário Soares em 1995), o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique em 2006, o grau de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Évora (Universidade que em 2009 instituiu uma Cátedra com o seu nome), o grau de Doutor Honoris Causa em Ciência Política pela Universidade Lusófona em 2012, recebeu a Medalha de Honra das cidades de Coimbra e de Lisboa e recebeu a Chave de Vila Nova de Gaia em 2021, e em 2022 foi-lhe atribuído mais uma vez o grau de Doutor Honoris Causa, desta vez pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, foi condecorado com a Medalha de D. Afonso Henriques pelo Exército Português e ainda lhe foi atribuído o Globo de Ouro de Mérito e Excelência da SIC. Todo este reconhecimento e prestígio deu ainda mais visibilidade à Delta e a Campo Maior, tornando-se cada vez mais um ponto de atração turística e de investimento.
Falando em Turismo e Investimento, a criação do Centro de Ciência do Café em 2014 foi uma preciosa modernização do antigo Museu do Café e tornou-se em mais um ponto de atração na vila de Campo Maior. Foi neste espaço que em 2022 foram recebidos vários embaixadores latino-americanos e se viu uma oportunidade de criar ligações pessoais, um dos seus pontos fortes, e de abrir caminho para negócios futuros, uma vez que são importadas cerca de 27 mil toneladas de café destes países. Por mais uma ocasião, a sua conhecida proximidade com os trabalhadores foi realçada: “Vou impressionado por duas coisas: o trabalho forte que fez esta família para desenvolver a empresa, mas sobretudo porque a base desse trabalho é a relação com os empregados. Pude perceber que todos os que aqui trabalham, sentem-se parte da família. E isso é um aspeto importantíssimo para crescer.” e “O que mais me chama a atenção na empresa, além dos bons resultados industriais, é a forma como mantém relações com o seu pessoal, de maneira harmónica. E a projeção social que vejo. Não é uma empresa que está longe da sociedade”, afirmaram os embaixadores peruano e dominicano, respetivamente, ao Diário de Notícias.
O seu envolvimento no Sporting Clube Campomaiorense trouxe mais uma vez Campo Maior aos holofotes nacionais. O seu investimento permitiu ter uma equipa do interior na Primeira Liga de futebol durante cinco épocas e até chegar a uma final da Taça de Portugal. Esta foi mais uma forma de promover o turismo e desenvolvimento da região e que permitiu levar mais longe a marca Delta.
Termino com duas frases de Presidentes da República, o timorense e o português, que resumem perfeitamente tudo aquilo que a obra do Comendador Rui Nabeiro representou, deixando a marca de alguém que transcendeu a sua vila e até o seu país, elevando-o ao estatuto de embaixador de Campo Maior, do Alentejo e de Portugal.
“Uma vida longa de grandes iniciativas empresariais, de criar emprego, riqueza para Portugal e para as comunidades onde a Delta estava instalada.” – José Ramos-Horta
“Rui Nabeiro foi um percursor, construiu uma marca global, com há poucas no nosso país, mantendo sempre a sede e o coração da sua atividade em Campo Maior, terra onde nasceu e deixa um generoso legado.” – Marcelo Rebelo de Sousa.
Gonçalo Folgado Nabeiro
Sem comentários:
Enviar um comentário