Investigador da Universidade de Évora aponta relação entre clima e propagação do vírus


O investigador Miguel Bastos Araújo, da Universidade de Évora, indicou hoje uma relação entre o clima e características epidemiológicas do novo coronavírus, cuja maior parte dos casos aconteceu em áreas “secas e com temperatura fresca”.
Em termos do número de pessoas infetadas no mundo, desde o início de janeiro e até à passada terça-feira, há “uma concentração de casos em áreas com uma temperatura fresca, ali por volta dos seis e dos nove a 10 graus”, indicou, em declarações à agência Lusa.
Segundo o investigador, Prémio Pessoa em 2018 e responsável pela Cátedra na área da Biodiversidade na Universidade de Évora (UÉ), “a maior parte dos casos” de pessoas com a doença Covid-19 verifica-se “em área secas” e “com uma precipitação baixa”, no período da infeção.
Esta relação “que parece haver entre as características epidémicas do vírus e o clima” é um dos resultados de um estudo de Miguel Bastos Araújo e do investigador iraniano Babak Naimi, da Universidade de Helsínquia (Finlândia).
No caso de Portugal, exemplificou, “o que se prevê é que, agora, em março e abril, o vírus continue em expansão”, porque “terá condições para isso”, mas espera-se que, “a partir de maio ou junho decaia abruptamente”.
“O que não quer dizer que não continue a haver contágios porque, por exemplo dentro de casa, com ar condicionado, essas são condições ideais para a propagação do vírus. O que se prevê é que seja muito mais reduzida essa propagação, as condições do ecossistema são menos adequadas para o vírus”, completou.
Os dois investigadores, a partir de uma base de dados americana, descarregaram os casos positivos do novo coronavírus, com a respetiva projeção geográfica – só consideraram localidades com mais de cinco casos -, e relacionaram-nos “com as condições climáticas nessa região” nos períodos dos contágios.
Conseguiram assim caracterizar o que, tecnicamente, se designa como “envelope climático”, ou seja, “as condições climáticas onde esses casos positivos se deram”.
“Ao fazer essa análise geográfica, detetámos qual é que é o ‘envelope ambiental’ global do vírus, neste momento, e projetámos, com uma série de modelos de inteligência artificial”, qual será, ao longo do ano, “o risco de contágio, com base em variáveis climáticas, em particular a temperatura e a precipitação”, explicou Miguel Bastos Araújo.
Os investigadores concluíram “que existe uma sazonalidade na atribuição do risco de contágio”, ou seja, “isto não é um crescendo eterno sem nenhum tipo de controlo ambiental. O mais provável é que haja uma sazonalidade, assim como nas gripes” e “como houve também no SARS-CoV”, o outro coronavírus anterior, que é “primo” do atual (denominado SARS-CoV-2), defendeu.
Este fator de sazonalidade, além do exemplo de Portugal, também “fará com que o hemisfério sul, quando lá for inverno”, na mesma altura em que será verão no hemisfério norte, “sofra o aumento da incidência do vírus”, argumentou.
“Estamos a falar da Argentina, África do Sul, Chile, sul do Brasil e da Austrália, por exemplo”, aludiu.
Segundo o investigador, também “a região temperada fria, que inclui o Canadá, a Rússia e os países escandinavos, terá um verão bastante arriscado” para a propagação do vírus: “O verão deles é parecido com a primavera cá, portanto, há uma deslocação, não só para sul, mas também para norte, dos riscos de incidência do vírus”.
Questionado pela Lusa sobre investigadores que rejeitam a ligação entre o clima e o novo coronavírus, Miguel Bastos Araújo disse discordar, contrapondo que, tal como o SARS-CoV, cuja “preferência climática” foi estudada e atestada cientificamente, parece-lhe evidente que este SARS-CoV-2 não “será insensível às condições de temperatura e humidade”.
Os investigadores, que aguardam a publicação dos resultados do estudo numa revista científica, optaram por divulgá-los – a investigação prossegue – por considerarem que estariam a “prestar um mau serviço à sociedade” ao reterem a informação.
E defendem que, perante esta correlação entre clima e características epidemiológicas do vírus, os países têm tempo para se adaptar e preparar os serviços de Saúde para uma nova época epidémica.
O novo coronavírus responsável pela Covid-19 foi detetado em dezembro, na China, e já provocou mais de 5.300 mortos em todo o mundo, levando a Organização Mundial de Saúde (OMS) a declarar a doença como pandemia.
O número de infetados ultrapassou as 140 mil pessoas, com casos registados em mais de 120 países e territórios, incluindo Portugal, que tem 112 casos confirmados.
A OMS declarou hoje que o epicentro da pandemia provocada pelo novo coronavírus se deslocou da China para Europa.

RRL // HB
Lusa

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