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Opinião: AINDA O FABRICO DOS POTES..., por Francisco Galego

Uma talha de grandes dimensões, assinada por José Martins Centeno de Campo Maior. Fotografada
num ferro-velho junto à Igreja do Senhor do Bom Fim, Portalegre. Foto: Gambozino Alentejano

Os “posts” que antes aqui publiquei sobre a questão do fabrico de “potes ou talhas” em Campo Maior tinham como intenção contribuir para propiciar um maior conhecimento de um aspecto importante da vida local, que se prolongou desde tempos antigos até meados do séc. XX.
É assunto que considero importante porque, sendo de facto uma comunidade que tinha como principal ocupação, fonte de rendimento e de sobrevivência,  as actividades agrícolas, levou ao desenvolvimneto de outros ramos de actividade que lhe eram complementares e que se traduzia  na existência  de variadas actividade artesanais. Ora, a olaria, foi sem dúvida uma das que maior nível de desenvolvimento e qualidade adquiriu, pois que a fama da sua qualidade provocou a sua difusão para outras localidades, algumas bastante afastadas do concelho de Campo Maior .
O interesse despertado por estes textos ficou bem demonstrado pelo número de leitores que tiveram e até pelos comentários que lhe vieram acrescentar conhecimentos. Entre eles, um merece especial destaque. Foi publicado no “post” datado de 1/2, para dar a conhecer um texto do Prof. Orlando Ribeiro, geógrafo, eminente cientista de renome internacional. O comentário foi aposto por Júlia Galego, que foi sua discipula e colaboradora. Este texto já tinha sido publicado no seu “blog” em:
Porque entendo que é muito importante o seu contributo para o conhecimento deste assunto merece o destaque de republicar o texto que se segue, até porque a sua leitura ajuda a comparar o processo de fabrico nele descrito, com o processo de fabrico em Campo Maior, descrito no “post” anterior :
“Em relação aos utensílios de cerâmica, largamente difundidos em todo o país, a originalidade do Alentejo consiste em ter conservado, de uma herança mediterrânea, o vasilhame para líquidos, principalmente para vinho, preparado e guardado, no resto de Portugal, em pipas e tonéis de madeira. Neste sentido, é mais uma das expressões da civilização do barro própria desta região.
As vasilhas chamam-se talhas ou potes e podem ter dois metros e meio de altura, capacidade para mais de 2000 litros e pesar 700 ou 800 quilos. Aí se lança o mosto com o bagaço, para fermentação, mudado depois para talhas semelhantes. Em baixo têm um buraco onde se mete o pipo, por cima são cobertas com papel ou uma pele de cabra, como a dos odres. Pela forma fazem lembrar grandes dolia romanos, que são provavelmente os seus paradigmas. Talhas mais pequenas e sem orifício usam-se para o azeite e as azeitonas curtidas (de tão importante papel na alimentação alentejana).
(...) Trabalhando o barro diversamente dos oleiros, (o fabricante de talhas de São Pedro do Curval) não sabe manejar a roda e considera a sua arte diferente. As talhas são feitas em arcos; o barro, amassado em forma de pães, é batido com uma palmatória e espalmado de encontro à mão; quando um pedaço da talha adquire certa consistência, corta-se o bordo delgado a toda a volta e continua-se aumentando a obra para cima. Sem roda, é necessária grande perícia para que o bojo se desenvolva simétrico. O fabricante desenhou nas paredes caiadas da oficina o contorno de talhas para diversas capacidades; tem feito até 2000 ou 2200 litros; começa várias ao mesmo tempo e vai-as levantando aos poucos; podem levar uns quatro meses a acabar e um a enxugar. Depois são colocadas cuidadosamente num carrinho, em cima de palha, e vão a cozer a um grande forno, cuja fornalha é escavada no chão. Quando a talha está cozida é besuntada, por dentro, com pês derretido, que torna o barro impermeável.”
(Orlando Ribeiro, Geografia e Civilização. Livros Horizonte. P. 46-49.)

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